“Nem todos, porém, obedeceram ao Evangelho, pois Isaías diz: ‘Senhor, quem acreditou no que ouviu de nós’? Logo, a fé vem pelo ouvir, e o ouvir, pela palavra de Cristo” (Rm 10, 16-17). Ao apresentar o pilar da Palavra, esta passagem é recordada na apresentação das Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil.

Num versículo anterior, a carta aos romanos fala da essencialidade do anúncio do querigma: “Como invocarão aquele em quem não creram? E como crerão naquele a quem não ouviram? E como ouvirão, se ninguém proclamar” (Rm 14)?

Dois acontecimentos nos oferecem oportunidade de colocar novamente o foco de nossas reflexões na Palavra de Deus: a Assembleia da CNBB que deverá aprovar o documento“Animação Bíblica da Vida e da Pastoral da Igreja no Brasil”, e a realização do mês da Bíblia. Ambos nos convidam a voltarmos às as fontes dos valores essenciais de nossa fé e reforçarmos nossa vida e nossa missão fundada no pilar da Palavra. Finalmente, no dia 25 de setembro, último domingo do mês, celebraremos também o Domingo da Palavra de Deus, conforme estabelecido pelo Papa Francisco com o Motu Proprio “AperuitIllis”. A data comum estabelecida é o 3º. Domingo do Tempo Comum, mas o Brasil recebeu autorização da Santa Sé para celebrar no já tradicional Dia da Bíblia, no mês de setembro.

O texto bíblico escolhido para leitura, estudo, reflexão e oração este ano é o Livro de Josué. Este livro aborda uma questão bem atual, que é a da conquista da terra. Foi escolhido também em sintonia com a comemoração dos 200 anos da Independência do Brasil (1822). A passagem escolhida como lema é “O Senhor teu Deus está contigo por onde quer que andes” (Js 1,9), que conclui o versículo que se inicia com palavras de encorajamento: “Acaso não te ordenei que sejas forte e corajoso? Não tenhas medo, não te acovardes”.

O Livro de Josué vem após o Livro do Deuteronômio, que foi estudado no Mês da Bíblia de 2020. Enquanto o Deuteronômio conserva a memória da Aliança entre Deus e o povo de Israel realizada no deserto, o Livro de Josué descreve como a Aliança vai sendo vivida na terra de Canaã.

O Livro fala da conquista, da partilha e do estabelecimento do povo na terra de Canaã,realidade esta apresentada como herança prometida por Deus. A liderança de Josué é destacada, mas o povo reconhece a presença de Deus em cada vitória, por isso celebra e agradece a Deus por cada conquista.

Devido ao domínio de ideologias, o tema da terra tornou-se um tabu para muitos na Igreja, como outros temas ligados à doutrina social da Igreja. É preciso desvencilhar-se dos limites das ideologias para acolher com liberdade a mensagem da Palavra de Deus e a doutrina da Igreja que a interpreta para cada tempo. Assim, o Livro de Josué nos mostra como a terra é dom de Deus para todos. Ela não deve ser acumulada por uns poucos, mas repartida como uma forma de garantir o direito à vida digna para as famílias, e ser cuidada e não explorada.

O Livro de Josué, como qualquer outro livro da Bíblia, não pode ser lido de forma fundamentalista, ao pé da letra. Essa leitura já serviu para justificar guerras e agressões.A história do Brasil, no tocante à conquista da terra, pode ser um exemplo disso. É preciso estudar a história do texto na época em que foi escrito, para colher a mensagem da Palavra de Deus aí manifestada e válida para todos os tempos.

O estudo do Livro de Josué ajuda certamente a alimentar a esperança e compromisso de fé expressos pelo Papa Francisco na Encíclica Fratelli Tutti: “É possível desejar um planeta que garanta terra, teto e trabalho para todos. Este é o verdadeiro caminho da paz,e não a estratégia insensata e míope de semear medo e desconfiança perante ameaças externas. Com efeito, a paz real e duradoura é possível só a partir de uma ética global de solidariedade e cooperação ao serviço de um futuro modelado pela interdependência e a corresponsabilidade na família humana inteira” (FT, n. 127).